sábado, 5 de julho de 2025

Poesia Ali Na Mesa - Roza Moncayo

      CISÃO

 

Estar neste mundo

é estar dividido entre o dentro

e o fora,

entre a vida

e o ir-se morrendo.

É desejar ardentemente religar-se,

unir suas partes

e sentir o horror desta impossibilidade.i

Estar neste mundo

é a todo instante ter de optar.

decidir...

Insegurança constante

claroescuro,

lusco-fusco que entorpece,

cava um abismo por entre as percepções,

os sentimentos,

e a seta ao longe prenunciando a morte.

Qual equilibrista,

num átimo de segundo,

é preciso decidir se o pé vai à direita,

à esquerda

ou um pouco mais à frente.

Ato que determinará o próximo passo,

ou,

se mergulhará

no nada.

 

VOO

 

Num galho solitário

de uma árvore qualquer,

as marcas recentes

de um voo interrompido.

 

APENAS SER

 

Às vezes me pego

olhando

para uma pedra,

uma flor,

invejando sua existência.

Não sonham,

não desejam,

não se frustram.

São o que são.

Ainda quando

se transformam

em buque

ou escultura,

continuam pedra

e flor.

Mais evoluidas,

não se deixam

influenciar por nada.

Mantêm-se na sua

serena sabedoria:

sem aflições inúteis,

sem exacerbadas tristezas.

Ser a pedra

ser a flor

nao ser "eu"

Apenas ser.

 

NINGUÉM VÊ

 

No limbo da pedra,

no fosso,

no fundo,

escorrem lágrimas

vermelhas

que repousam

coaguladas,

no esquecimento

das pequenas fissuras.

Ninguém vê.

Como se não houvesse choro,

nem pedra,

nem gente.

Ninguém vê

ou sente.

 

UNÍSSONO

 

súbita

solidão

soluça

silenciosamente

no cio sem solução

sem sol

---unção

…………………………………….

escorre dos dedos

como notas musicais volatizadas

o testemunho do gozo solitário

 

SERIA MAIS FELIZ?

 

e se eu rasgasse a carne

o ventre

os versos?

assumisse de vez

o incontrolável

o intolerável

O inadmissível?

sonhos

jorrando do êxtase

a noite virada dia

sexo

todo dia

e os versos 

Os versos na carne

nos ossos

no sangue da língua

no sabor quente

do suor

na exaustão do viver

assim

entre versos

berros

estradas escarpadas

e ranhuras no céu

se eu assumisse este horror

seria mais feliz?

 

DESASSOSSEGO

 

o que fazer

com este desassossego

esta intemperança?

metê-los no bolso do sobretudo?

não uso sobretudo

vestimenta alguma

me protege

nu

não tenho como livrar-me

e o desassossego

penetra-me

acomodando-se por dentro

incomodando-me à loucura

 

MANIFESTO


fica decretado o fim da opressão

do desrespeito

dos interesses escusos do capital

que o artista seja livre

para criar

para inquietar com suas ideias

para revolucionar com o novo

descartando a novidade passageira

que o artista seja livre

para que

com sua magia

retire do sono profundo

os seres dormidos

C que estes

de olhos e corações expandidos

resultem em novos seres

capazes de paz

liberdade

fica decretado o fim do isolamento

da alienação

do desencontro

que

respeitado o tempo solitário da criação

tudo o mais seja partilhado

para que se amplie

€ Se multiplique

em beleza e reflexão

em intervenção

em mudança

fica decretado ainda

que a partir de agora

nós

eternos aprendizes

mais do que nunca

não permitiremos vendas nos olhos

no coração

travas

e nenhuma amarra nas mãos

 

Roza Moncayo 

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sexta-feira, 4 de julho de 2025

BValbúrdia PoÉtica - Dois Perdidos Em Seus Poemas Sujos

Balbúrdia PoÉtica

Federico  Baldelaire  e EuGênio Mallarmè

Dois Perdidos Em Seus Poemas Sujos

Dia 1 julho – 2025 – no C.E. José do Patrocínio - Cejopa

Á memória de Plínio Marcos 

*

Irina  me comia com os olhos tímido sorriso nos lábios a tarde inteira no terreiro como se quisesse tocar minhas mãos ensanguentadas de poemas sujos primeiro de julho e o calendário marcava véspera da independência de um país proclamada por uma negra baiana ela olhou o céu e deixou a luz do sol entrar em seus olhos que faiscavam por desejo ou prece fome de poesia de poesia que eu despejava em seus olhos tesos a cena continuou acesa até que no final da cena lhe peguei pelas mãos e uma Jura Secreta  coloquei em sua boca sem querer saber da sensação havida trouxe para dentro do tecido do poema em sua hora  e as vezes me pergunto para quem ela sorri agora?

 

Federico Baudelaire

Dois Perdidos Em Seus Poemas Sujos

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fotos: Nilson Siqueira 



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quarta-feira, 2 de julho de 2025

Balbúrdia PoÉtica 10 - Casa da Palavra - Santo André-SP

  Dalila Teles Velas

Poesia Viva – poeta homenageada na Balbúrdia PoÉtica 10 – Dia 12 de julho das 14 às 19h – Casa da Palavra – Praça do Carmo, 171 – Santo André-SP

*

Dalila Teles Veras Nascida em Portugal, vive no Brasil desde a infância. Escritora, editora e ativista cultural. Publicou mais de duas dezenas de livros nos gêneros poesia, crônica e ensaio. tempo em fúria, 2019, a mulher antiga, 2017; SETENTA anos poemas leitores, poemas escolhidos por 70 leitores por ocasião dos seus 70 anos, 2016, solidões da memória, 2015 e estranhas formas de vida, 2013, os mais recentes, todos de poesia. Dentre outros, publicou dois livros reunindo crônicas publicadas na imprensa diária (A vida crônica e As artes do ofício) e dois diários (Minudências e Diuturnos). Dirige a Alpharrabio Livraria, Editora e Espaço Cultural, em Santo André – SP, desde 1992. Integra, pelo 4º mandato, o Comitê de Extensão e Cultura da UFABC (Universidade Federal do ABC), representando a comunidade externa.

dalila@alpharrabio.com.br /
www.dalila.telesveras.nom.br
http://dalilatelesveras.blogspot.com/


sonho (re)corrente

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
– depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Naufrágio, Cecília Meireles

um rio, estreito e veloz
:
na superfície, aconchegada
(líquido conforto)
eu mesma, barco
nele navego

tudo é sensação e velocidade
as margens próximas
(quase tocáveis)
a paisagem borrada
(não há contemplação
nem há tempo)

corre o rio, corro com ele

rua lamacenta
agora, o rio
nítida, a paisagem
(desolação)

onde recomeça o rio?
muito distante daqui
dizem-me
sem mensurar distâncias
nem me olhar nos olhos

(“estranhas formas de vida”, Dobra/Alpharrabio Edições, 2015, SP)


vias oblíquas

depois que a mulher voejou
levando consigo a
claridade dos cômodos e
décadas coabitadas, o
marido, no escuro
ensimesmado
deixou o cabelo crescer, o
mato tomar conta dos
canteiros, o
pó cobrir móveis e assoalhos

sete luas após a mulher
levar consigo a sonoridade
da alcova, o marido
às claras e resoluto
reagiu
engaiolou dez pássaros e
registrou em cartório o
certificado de propriedade
dos novos moradores
(garantia do controle de vôos e
ingresso permanente a
concertos privados)

“estranhas formas de vida”, (Dobra/Alpharrabio Edições, 2015, SP)


o neto e o avô

lentos, seguem
os pequeninos pés
dos grandes pés ao lado

inseguros e próximos
em seu início o primeiro
o outro no seu final

sabem-se (?), ambos, reféns
da inexorável marcha e
(des)cuidados alheios

“estranhas formas de vida”, (Dobra/Alpharrabio Edições, 2015, SP)


Dois Poemas Inéditos, do livro ‘Tempo em Fuga”, a sair

ausência

teu nome bordado
enxuga-me o corpo
doído de ausência

o cheiro de sol
e gosto de alfazema
lembram
não mais agasalham

uma casa segue
teimosamente
igual, enganosamente
igual, sem a alma
nem as mãos que
um dia a arquitetaram

no vazio, a
evocação da presença
as marcas da presença
e a opressão dos objetos
sem o sentido original

plantas, móveis, louças
não mitigam saudades
nem preenchem
ausências

uma casa segue
teimosamente
à busca
de quem não mais


capacidade de abstração
ou pontos de vista

criança
pacientemente
acompanhava
o caminhar das formigas
lagartixas, lesmas
coisas e seres
rasteiros

o universo circunscrito
ao alcance da vista
sem metafísica ou subjetivismo
(conhecer era
concretamente
ver)

provecta
pelas nesgas permitidas
espia o firmamento
na cidade que o nega

desejos de amplidão
recria o que vê
escreve e projeta
além do visto

além do prazo 

Dalila Teles Veras Nascida em Portugal, vive no Brasil desde a infância. Escritora, editora e ativista cultural. Publicou mais de duas dezenas de livros nos gêneros poesia, crônica e ensaio. tempo em fúria, 2019, a mulher antiga, 2017; SETENTA anos poemas leitores, poemas escolhidos por 70 leitores por ocasião dos seus 70 anos, 2016, solidões da memória, 2015 e estranhas formas de vida, 2013, os mais recentes, todos de poesia. Dentre outros, publicou dois livros reunindo crônicas publicadas na imprensa diária (A vida crônica e As artes do ofício) e dois diários (Minudências e Diuturnos). Dirige a Alpharrabio Livraria, Editora e Espaço Cultural, em Santo André – SP, desde 1992. Integra, pelo 4º mandato, o Comitê de Extensão e Cultura da UFABC (Universidade Federal do ABC), representando a comunidade externa.

dalila@alpharrabio.com.br /
www.dalila.telesveras.nom.br
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sonho (re)corrente

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
– depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Naufrágio, Cecília Meireles

um rio, estreito e veloz
:
na superfície, aconchegada
(líquido conforto)
eu mesma, barco
nele navego

tudo é sensação e velocidade
as margens próximas
(quase tocáveis)
a paisagem borrada
(não há contemplação
nem há tempo)

corre o rio, corro com ele

rua lamacenta
agora, o rio
nítida, a paisagem
(desolação)

onde recomeça o rio?
muito distante daqui
dizem-me
sem mensurar distâncias
nem me olhar nos olhos

(“estranhas formas de vida”, Dobra/Alpharrabio Edições, 2015, SP)


vias oblíquas

depois que a mulher voejou
levando consigo a
claridade dos cômodos e
décadas coabitadas, o
marido, no escuro
ensimesmado
deixou o cabelo crescer, o
mato tomar conta dos
canteiros, o
pó cobrir móveis e assoalhos

sete luas após a mulher
levar consigo a sonoridade
da alcova, o marido
às claras e resoluto
reagiu
engaiolou dez pássaros e
registrou em cartório o
certificado de propriedade
dos novos moradores
(garantia do controle de vôos e
ingresso permanente a
concertos privados)

“estranhas formas de vida”, (Dobra/Alpharrabio Edições, 2015, SP)


o neto e o avô

lentos, seguem
os pequeninos pés
dos grandes pés ao lado

inseguros e próximos
em seu início o primeiro
o outro no seu final

sabem-se (?), ambos, reféns
da inexorável marcha e
(des)cuidados alheios

“estranhas formas de vida”, (Dobra/Alpharrabio Edições, 2015, SP)


Dois Poemas Inéditos, do livro ‘Tempo em Fuga”, a sair

ausência

teu nome bordado
enxuga-me o corpo
doído de ausência

o cheiro de sol
e gosto de alfazema
lembram
não mais agasalham

uma casa segue
teimosamente
igual, enganosamente
igual, sem a alma
nem as mãos que
um dia a arquitetaram

no vazio, a
evocação da presença
as marcas da presença
e a opressão dos objetos
sem o sentido original

plantas, móveis, louças
não mitigam saudades
nem preenchem
ausências

uma casa segue
teimosamente
à busca
de quem não mais


capacidade de abstração
ou pontos de vista

criança
pacientemente
acompanhava
o caminhar das formigas
lagartixas, lesmas
coisas e seres
rasteiros

o universo circunscrito
ao alcance da vista
sem metafísica ou subjetivismo
(conhecer era
concretamente
ver)

provecta
pelas nesgas permitidas
espia o firmamento
na cidade que o nega

desejos de amplidão
recria o que vê
escreve e projeta
além do visto
além do prazo



BalBúrdia PoÉtica 10

Poesia Ali Na Mesa

Casa da Palavra – Santo André-SP

Dias 12 de julho das 14 às 19h

Praça do Carmo, 171

Curadoria:

Artur Gomes, Cesar Augusto de Carvalho, Julio Mendonça, Jurema Barreto e Silvia Helena Passarelli

Homenagens:

Poesia Viva: Dalila Teles Veras

a memória de Antônio Possidônio Sampaio, Francis de Oliveira e Wilma Lima

exposição - livros - roda de conversa - performances - homenagens

*

Balburdiar : Eis O Verbo

Balbúrdia significa desordem barulhenta; vozearia, algazarra, tumulto. É isso que se propõe realizar na Casa da Palavra, em Santo André, em 12 de julho.

Projeto do multiartista Artur Gomes que passa por diversas cidades brasileiras, especialmente no eixo Rio – São Paulo, a Balbúrdia Poética chega a Santo André propondo ser um local de reflexões, trocas e muita poesia.

Poetas confirmados:

Abel Coelho + Ademir Demarchi + Alessandro de Paula + Antonio Carlos Pedro +Armando Liguori Jr. + Arnaldo Afonso + Augusto Contador Borges + Beth Brait Alvim + Betty Vidigal + Carlos Galdino + Carolina Montone + Cleber Baleeiro + Décio Scaravelli + Danihell TW + Dilène Barreto + Dione Barreto + Elcio Fonseca +Franklin Valverde + Urbanista Concreto + Ieda Estergilda Abreu + Ingrid Morandian + Jane Arruda de Siqueira + Julio Bittar + Junior Belle + Luisa Silva de Oliveira + Luiz Henrique Gurgel + Marcelo Brettas + Marise Hansen + Paulino Alexandre + Remisson Anicetto + Roberto Bicelli + Rosana Venturini + Roza Moncayo + Vera Barbosa + Vlado Lima

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sábado, 31 de maio de 2025

o mesmo abismo

O Mesmo Abismo

Acorda sempre no mesmo horário,
mas não é o relógio — é a corda.
Há algo que o puxa de dentro pra fora,
como se o próprio corpo fosse um casulo vencido.
A cama é um túmulo em prestação.
Desperta com olhos que não pediram pra abrir.
Mais um dia. O mesmo.
Mas o que é o mesmo, senão a forma mais sutil do nada?

Levanta-se como quem cumpre pena.
A cozinha o espera com a indiferença dos objetos.
O pão. A xícara. O café.
Símbolos de um pacto não assinado,
mas renovado toda manhã.
Morde o pão com a resignação de um animal domesticado,
e engole o silêncio junto com a borra amarga.

A água do chuveiro escorre sem pressa —
não há para onde ir que já não seja onde se esteve.
O vapor sobe como uma alma sem rumo,
e no espelho, o rosto…
ah, o rosto.
Esse estranho conhecido que repete feições
com a fidelidade dos condenados.

Veste-se como quem encena um papel.
E quem escreveu esse roteiro?
Deus? O acaso? A covardia?
Tudo nele é pontual:
a comida ao meio-dia, o descanso às três,
o tédio bem dividido em partes simétricas.

Cada tarefa é um gesto litúrgico
em honra a um deus que não se revela.
A rotina é a missa,
e ele é sacerdote e oferenda.

Às vezes, ao entardecer,
sente uma vertigem sutil —
como se o chão, por um segundo,
quisesse lhe contar um segredo.
Mas não diz.
E o silêncio volta a ocupar tudo.

Janta sem apetite,
como quem prova a própria ausência.
E a noite se arrasta,
não como bicho, mas como prece:
“que tudo mude…
mas só depois que eu dormir.”

Deita, enfim.
E o lençol é uma pergunta mal feita.
Dormir?
Ou apenas fingir que há fuga?

Pois viver assim é como ser página
de um livro que nunca avança.
Está lá — impresso, inevitável —
mas ninguém lê.

Simone Bacelar

2025


terra de santa cruz

I

ao batizarem-te

deram-te o nome:

posto que a tua profissão

é abrir-te em camas

dar-te em ferro

ouro

prata

rios

peixes

minas

mata

deixar que os abutres

devorem-te na carne

o derradeiro verme

 

Artur Gomes

poema dos livros Couro Cru & Carne Viva - 1987

e Pátria A(r)mada - 2022

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CarNAvalha Gumes

 

Escrito nos anos de 1990 este poema hoje no Brasil  é atualíssimo visto esse atual congresso da desordem democrática que o país em hoje. O que será que fizemos nos verões passados para chegarmos a essa situação?

 

neste país de fogo & palavra

se falta lenha na fornalha

uma mordaz língua não falha

cospe grosso na panela

           da imperial tropicanalha

 

não me metam nesses planos

verdes/amarelos

meus dentes vãos  a(r)mados

nem foices nem martelos

meus dentes encarnados

alvos brancos belos

          já estão desenganados

             desta sopa de farelos

 

Artur Gomes

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Manual de uso para um grito qualquer

não grite.
ninguém está ouvindo
e se estiver,
vai pensar que é efeito colateral
do ansiolítico
ou sessão do descarrego.

o grito é um luxo de gente com estômago cheio.
aqui em casa se engole, com bastante ironia,
com casca, espinha, relógio adiantado
e boletos vencidos.

se quiser gritar, faça com elegância.
num canto,
sem cuspir,
sem atrapalhar a novela da vizinha.

o grito, meu amigo,
é um tipo de ternura deformada.
um amor velho que perdeu o endereço
e agora ronda feito mendigo:
deitado entre o riso e o papelão.

o grito é feio.
é barulho de gente que perdeu a compostura
e pariu um som no meio da rua,
com sangue
e sem anestesia.

gente civilizada não grita.
gente civilizada tranca o berro
numa gaveta, cheia de pornografia e bíblia.

ninguém se importa com o seu grito.
há quem o transforme em arte,
há quem o transforme em estatística,
você o transforma em úlcera.

e o mais importante:
nunca demonstre que está gritando.
sorria,
elogie o tempo,
beba alguma coisa,
morra devagar.

é assim que se grita hoje em dia:
com discrição,
com CPF
e sem perturbar o sossego alheio.

porque grito,
esse grito nosso de cada dia
é o que resta,
quando até Deus
já fez silêncio.

Simone Bacelar



Bandeira -

poema de Julio Mendonça -

Balbúrdia PoÉtica 10 -

dia 12 de julho das 14 às 19h

na Casa da Palavra - Santo André-SP

https://www.instagram.com/p/DLXMNWCO2yF/


Jura secreta 34

por que te amo
e amor não tem pele
nome ou sobrenome

não adianta chamar
que ele não vem quando se quer
porque tem seus próprios códigos
e segredos

mas não tenha medo
pode sangrar pode doer
e ferir fundo
mas é razão de estar no mundo

nem que seja por segundo
por um beijo mesmo breve
por que te amo
no sol no sal no mar na neve

Artur Gomes
poema do livro Juras Secretas
Litteralux – 2018

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                                     1. 

e sigo assim

tecendo tramas

das ramas

desse plantio

tardio

 

volto ao chão

onde jaz

meu umbigo

 

colho o pão

da mão do amigo

 

quanto mais

serenos

mais ando

querendo

menos

*

Odisséia Mínima

ao vencedor

as batalhas

aos campeões

a caminhada

aos fortes

mais nortes

aos frios

os navios

 

nunca se chega

ao fim no fim

 

depois de tudo

a névoa do nada

a lhe lamber

as feridas

 

aos que chegam

restam

as saídas

*

3.

 

tô por aqui

de rima perfumada

de prosa empilhada

de poema piada

 

até a tampa

de hai cai de lado

de soneto desmembrado

de slogan disfarçado

 

super satisfeito

de poeta que não lê

designer que não vê

de tanto eu,

antes de você.

*

4. 

tem poeta de tudo quanto é jeito

 

tem os que esperam ônibus

tem os que compram ônibus

tem os que tomam ônibus

 

e tem este mal-traçado

que por falta de audácia

ou ocasião até

anda na linha

a pé 

* 

5.

 

virgília

 

dormi pound

   sonhei paz

acordei enfim

   pobre de mim

fosse  assim

   uma lasca

de leminski

   já seria demais

6.

volta 

não me taques na cara 

todos teus tiques

não me tocas nem

trincas meu dique

com esses paquetes

quase a pique

por outra

se jurares

não me deixar

à mercê

saibas que tenho                   

outra ítaca

inteira

para você

*

7.

 Verso

 

re

   tomar

      o dia

 

re

   visitar

      a utopia

 

re

   formar

      o nexo

 

re

   fazer

      o sexo

 

re

   presar

      a sangria

 

re

   suscitar

      a alegria

*

 

8. 

p(l)anos

 

vislumbrando que viro velho

metade dos amigos mortos

descarto comidos conselhos

escolho caminhos tão tortos

 

mas nem afoito nem cansado

viro o mundo e volto ao berço

rompo essas ruas alentado

cumpro contratos pelo verso

 

talvez a hora de ir em frente  

riscando a linha do exemplo

largando ao tempo o legado

 

singrando o mar do divergente

a folha como vela e templo

a pena feita quilha e arado

*

9

carpe o dia

 

firmarei futuro

   quando mais maduro

 

lerei outro lado

   quando ajuizado

 

mãos ao montepio

   findo o desvario

 

lote ou terreno

   quando mais sereno

 

ser esse estóico

   tão exemplar

 

dedicado a arrancar

   cada espinho

 

das rosas não plantadas

   pelo caminho

*

10. 

somana

 

mário era índio preto que tacapeou o tripé de tarsila deixando o aluno oswald brasil no pau nesse capão de capiau 

desterrados no leblon e curtas camadas de copacabana desfiariam décadas para apoucar a fama de apenas uma sopesada semana 

vila ventilava a taba que assobiava com o bento enquanto paliçava os entes entre uma e outra sardinha deglutida na palhoça gourmet 

da janela do futuro o céu dos artistas enfileirava músicospintorespoetasescultores aguardando centenas de semanas para esticar as estacas da vida nessa pobre capoeira na esteira do pé de vento deste centrípeto movimento 

e hoje, sem saída na rua da abolição, o rio deságua no bar piratininga, na esquina perdida da cidade de deus, ateus e racionais trazem o trombone para a intriga encerrada por emicida, fim da semana, a insurgência de um novo dia, o centro agora é a periferia


      Elcio Fonseca

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*

Balbúrdia PoÉtica 10

Poesia Ali Na Mesa

Dia 12 julho – das 14 às 19h

Casa da Palavra – Praça do Carmo, 171

Santo André-SP

Curadoria: Artur Gomes, César Augusto de Carvalho, Julio Mendonça, Jurema Barreto e Silvia Helena Passareli

 

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Vira Lata

 

chega das  caretices e dos puxa saquismos

das divindades caídas

dos reinos unidos fragmentados

dessa porra desse computador

 

Ai que saudades

 

das simplicidades sem vistorias

de águas paradas, porém,

livres e libertas

da negra do cachimbo

do sertão agreste

sem veredas

das tabernas

de Máximo Gorki

 

da merda sem parasitas

do homem

do humano

que escarrou e sujou o tempo

embaçou os vidros

com seu hálito fétido

 

medidas inexpressivas

fazem

essa espécie híbrida,

incapaz, sonolenta,

sorrir.

com seus dentes amarelados, cheio de cáries...

 

eu vou pra Tucumã

aliciar meus tormentos

dormir com as cabras

e fuder com os jumentos

 

                Luiza Silva Oliveira

*

CISÃO

 

Estar neste mundo

é estar dividido entre o dentro

e o fora,

entre a vida

e o ir-se morrendo.

 

É desejar ardentemente religar-se,

unir suas partes

e sentir o horror desta impossibilidade.i

 

Estar neste mundo

é a todo instante ter de optar.

decidir...

Insegurança constante

claroescuro,

lusco-fusco que entorpece,

cava um abismo por entre as percepções,

os sentimentos,

e a seta ao longe prenunciando a morte.

 

Qual equilibrista,

num átimo de segundo,

é preciso decidir se o pé vai à direita,

à esquerda

ou um pouco mais à frente.

 

Ato que determinará o próximo passo,

ou,

se mergulhará

no nada.

 

*

 

VOO

 

Num galho solitário

de uma árvore qualquer,

as marcas recentes

de um voo interrompido.

 

*

 

APENAS SER

 

Às vezes me pego

olhando

para uma pedra,

uma flor,

invejando sua existência.

 

Não sonham,

não desejam,

não se frustram.

 

São o que são.

 

Ainda quando

se transformam

em buque

ou escultura,

continuam pedra

e flor.

 

Mais evoluidas,

não se deixam

influenciar por nada.

 

Mantêm-se na sua

serena sabedoria:

sem aflições inúteis,

sem exacerbadas tristezas.

 

Ser a pedra

ser a flor

nao ser "eu"

Apenas ser.

 

*

NINGUÉM VÊ

 

No limbo da pedra,

no fosso,

no fundo,

escorrem lágrimas

vermelhas

que repousam

coaguladas,

no esquecimento

das pequenas fissuras.

 

Ninguém vê.

Como se não houvesse choro,

nem pedra,

nem gente.

 

Ninguém vê

ou sente.

*


UNÍSSONO

 

súbita

solidão

soluça

silenciosamente

no cio sem solução

sem sol

---unção

 

…………………………………….

 

escorre dos dedos

como notas musicais volatizadas

o testemunho do gozo solitário

 

                              Roza Moncayo

*



Lidiane Carvalho Barreto na Balbúrdia PoÉtica 9 falando o poema Itabapoana Pedra Pássaro Poema de Artur Gomes
12ª Bienal do Livro de Campos dos Goytacazes-RJ

tabapoana Pedra Pássaro Poema

uma metáfora
não é apenas uma metáfora
quando a pedra é pássaro

em gargaú
às 5 horas da tarde
as garças voam
em direção
ao outro lado da pedra
em guaxindiba
tenho em mim
que pássaros voam
peixes nadam
quando procuram
outro pouso

bracutaia eterna lenda
estranho pássaro
da pedra ouviu o grito
que voou de gargaú pro infinito

Artur Gomes
poema do livro Itabapoana Pedra Pássaro Poema

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*


Hoje

Balbúrdia PoÉtica 9

No Café Literário – 14h

12ª Bienal do Livro de Campos dos Goytacazes-RJ 

Artur Gomes convida:

Clara Abreu + Grupo Gotta + Jailza Mota + Joilson Bessa + Lidiane Carvalho Barreto + Maycon Maciel + Paulo Victor Santana + Reubes Pess + Rossini Reis

 

Artur Gomes convida:

Clara Abreu + Grupo Gotta + Jailza Mota + Joilson Bessa + Lidiane Carvalho Barreto + Maycon Maciel + Paulo Victor Santana + Reubes Pess + Rossini Reis

Itabapoana Pedra Pássaro Poema

 

uma metáfora

não é apenas uma metáfora

quando a pedra é pássaro

 

em gargaú

às 5 horas da tarde

as garças voam

em direção

ao outro lado da pedra

em guaxindiba

tenho em mim

que pássaros voam

peixes nadam

quando procuram

outro pouso

 

bracutaia eterna lenda

estranho pássaro

da pedra ouviu o grito

que voou de gargaú pro infinito


Artur Gomes

Do livro Itabapoana Pedra Pássaro Poema

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choveu pedra em São Francisco do Itabapoana se de gelo ou granizo inda nem sei só depois da apuração da comissão de inquérito instaurada por alguns moradores da localidade  do Macuco saberei.

 

                       Federico Baudelaire

 

cada qual com sua Natureza , pode ser garoa ou correnteza , é o tempo comandando a sua Fortaleza

 

                                       Zhô Bertholini

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com os dentes

cravados na memória

 

botei fogo no oitavo andar

do paiol de milho do meu pai

tinha sete anos de pirotecnia

quebrei o pulso esquerdo

quando pulei direto do abismo

     para  o corpo solar da poesia

Beatriz – A Morta

Oswald de Andrade Re-Visitado


como pedra me olhas

como fedra te vejo

vestida de carne nua

a língua na maçã navalha

tua alma transparente crua

o olho por detrás da porta

poema com pavio aceso

quando Oswald pariu A Morta

tinha os dentes

nos teus olhos presos


                          Artur Gomes



 O poeta enquanto coisa


o meu lugar não é aqui
o meu lugar não é ali
o meu lugar é lá

onde garrincha entorta
os laterais esquerdos
dibla até o goleiro
e debaixo da trave
não faz o gol

um desacerto

volta ao meio do campo
para re-começar o desconcerto

Artur Gomes
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*

Balbúrdia PoÉtica 9

A resistência através da poesia

Dia 4 – junho – 14h

Café Literário – 12ª Bienal do Livro  de Campos dos Goytacazes-RJ

 

Artur Gomes convida:

 

Clara Abreu + Grupo Gotta + Jailza Mota + Jilson Bessa + Lidiane Carvalho Barreto + Maycon Maciel + Reubes Pess + Rossini Reis

 

Kapi – presente – Lenilson Chaves – presente – Marielle Franco – presente – Maria Helena Gomes – presente – Ive Carvalho – presente – Lucia Miners – presente

 

Selvagem

 

" enterrem meu coração

na curva do rio"

peço

como pediu um índio

que, estrangeiro,

sabia falar a língua

da minha flauta alma,

índia que sou,

selvagem

Se as pernas cruzo

social,

em vernissagens,

a alma é acocorada,

ouvido alerta

para os ruídos

quase nada

de uma selva

em que, matreiro,

o inimigo surja.

Se, requintada,

canapés mordisco,

Dama da Corte,

a alma antropofagicamente,

rosna

o seu pedaço de caça.

Bebo na concha

das mãos

água riacho

quando levemente

seguro a taça

em que me servem

a mesma água.

O banho perfumado

em sabonete e shampoos,

é, apenas,

o verniz

que descascado,

desvenda o banho,

que, em meu rio,

limpo o corpo

com folhas

e flores abertas

madrugadas.

Jamais estive grávida,

mas prenhe;

nunca me nasceram filhos,

os pari,

quando meu grito

primevo

se fez soluço

ao agarrá-los,

fera,

e lambê-los

crias, curumins.

Cheiro, disfarçada,

o ar desses salões

e o meu faro

é faro de onça

na espreita

do perigo,

como só índio

e animal

sabem espreitar.

Meu grito de guerra

ecôa no silêncio,

se palavra cambaia

agride a minha

escuta

e não confundo

doce, àquela que amarga,

mesmo que enfeitada

em pétala de flor.

Sei exatamente

o curso do meu rio,

guia seguro,

mateiro,

meu irmão,

que me levará

a salvo

à clareira

em que adormeço.

Por isso peço:

"enterrem meu coração

na curva do rio".

E meu rio

é esse Paraíba

que se disfarça civilizado,

já que, em cidade corre,

mas que é,

como todo rio,

o que desliza na selva

em que algum dia

nasci.

 

Lucia Miners

 

Fulinaíma MultiProjetos

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Poesia Ali Na Mesa - Roza Moncayo

      CISÃO   Estar neste mundo é estar dividido entre o dentro e o fora, entre a vida e o ir-se morrendo. É desejar ardentemente religar-se...