CISÃO
Estar neste mundo
é estar dividido entre o dentro
e o fora,
entre a vida
e o ir-se morrendo.
É desejar ardentemente religar-se,
unir suas partes
e sentir o horror desta impossibilidade.i
Estar neste mundo
é a todo instante ter de optar.
decidir...
Insegurança constante
claroescuro,
lusco-fusco que entorpece,
cava um abismo por entre as percepções,
os sentimentos,
e a seta ao longe prenunciando a morte.
Qual equilibrista,
num átimo de segundo,
é preciso decidir se o pé vai à direita,
à esquerda
ou um pouco mais à frente.
Ato que determinará o próximo passo,
ou,
se mergulhará
no nada.
VOO
Num galho solitário
de uma árvore qualquer,
as marcas recentes
de um voo interrompido.
APENAS SER
Às vezes me pego
olhando
para uma pedra,
uma flor,
invejando sua existência.
Não sonham,
não desejam,
não se frustram.
São o que são.
Ainda quando
se transformam
em buque
ou escultura,
continuam pedra
e flor.
Mais evoluidas,
não se deixam
influenciar por nada.
Mantêm-se na sua
serena sabedoria:
sem aflições inúteis,
sem exacerbadas tristezas.
Ser a pedra
ser a flor
nao ser "eu"
Apenas ser.
NINGUÉM VÊ
No limbo da pedra,
no fosso,
no fundo,
escorrem lágrimas
vermelhas
que repousam
coaguladas,
no esquecimento
das pequenas fissuras.
Ninguém vê.
Como se não houvesse choro,
nem pedra,
nem gente.
Ninguém vê
ou sente.
UNÍSSONO
súbita
solidão
soluça
silenciosamente
no cio sem solução
sem sol
---unção
…………………………………….
escorre dos dedos
como notas musicais volatizadas
o testemunho do gozo solitário
SERIA MAIS FELIZ?
e se eu rasgasse a carne
o ventre
os versos?
assumisse de vez
o incontrolável
o intolerável
O inadmissível?
sonhos
jorrando do êxtase
a noite virada dia
sexo
todo dia
e os versos
Os versos na carne
nos ossos
no sangue da língua
no sabor quente
do suor
na exaustão do viver
assim
entre versos
berros
estradas escarpadas
e ranhuras no céu
se eu assumisse este horror
seria mais feliz?
DESASSOSSEGO
o que fazer
com este desassossego
esta intemperança?
metê-los no bolso do sobretudo?
não uso sobretudo
vestimenta alguma
me protege
nu
não tenho como livrar-me
e o desassossego
penetra-me
acomodando-se por dentro
incomodando-me à loucura
MANIFESTO
fica decretado o fim da opressão
do desrespeito
dos interesses escusos do capital
que o artista seja livre
para criar
para inquietar com suas ideias
para revolucionar com o novo
descartando a novidade passageira
que o artista seja livre
para que
com sua magia
retire do sono profundo
os seres dormidos
C que estes
de olhos e corações expandidos
resultem em novos seres
capazes de paz
liberdade
fica decretado o fim do isolamento
da alienação
do desencontro
que
respeitado o tempo solitário da criação
tudo o mais seja partilhado
para que se amplie
€ Se multiplique
em beleza e reflexão
em intervenção
em mudança
fica decretado ainda
que a partir de agora
nós
eternos aprendizes
mais do que nunca
não permitiremos vendas nos olhos
no coração
travas
e nenhuma amarra nas mãos
Roza Moncayo
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https://fulinaimamultiprojetos.blogspot.com/
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