sábado, 20 de abril de 2024

Múltiplas Poéticas

SALTO 

Eu, que tenho a idade dos lobos nas festas dos cemitérios

Eu, que sinto o pulso das marés nas ondas que não mais surfo

Eu, que vi o último pássaro a vagar solto pelos vales soturnos

aprendi a liberdade do beijo na boca saborosa do espelho

Eu, que tenho o sexo a latejar loucuras, punhais, venenos

e vi meninos negros a mendigar brinquedos

acreditei em estrelas, luas, mistérios e desejos

Eu, que compreendo os velhos que do amor não souberam

e cresci ouvindo o pai dizer homem não chora

ainda choro ao ouvir o som das sanfonas nos desertos

Eu, que no escuro cego ainda sinto os dedos fálicos e crus

dos mágicos sonhos secretos e gozo

Eu, que desde antes do Dilúvio perdi a fé

aprendi que Deus é um ser estranho

fantasma que come seus frutos

Eu, incêndio inaugurando o mar

Eu, o permanente escândalo dos rumores e provérbios

a água que não pode ser bebida

a hóstia que não pode ser servida

a pele que não pode ser tocada

o corpo que não pode ser comido

para que o labirinto não se desfaça

e a esfinge não perca o seu encanto

Eu, que sei o insustentável peso da paixão

do preço de um homem no chão

do olho que só me vê fora de mim

espião

de mim mesmo o ladrão

alma que se liberta do seu cão

Eu, esse descompasso corporal

aprendi que fazer poemas é equilibrar ócio e vício

e me assusta a luz da lua entrando

pela janela aberta desse edifício

 

(Tanussi Cardoso)


*

 

DE QUE SÃO FEITAS AS HORAS?

 

Vale a palavra e a terra azul

a menina da tarde florida

o relógio de olhos sonolentos da manhã.

 

Tudo volta no gesto silencioso

Do moço de capa de chuva sob as estrelas

Na noite ferida de inquietude parda.

 

De que são feitas as horas?

 

(Luiz Eudes)

 

Portanto, não deixem de ler e adquirir o livro de LUIZ EUDES: “MANHÃ NA GARGANTA” (Pragmatha Editora, 2024), belo a partir do título.

https://artecult.com/sextas-poeticas-confira-o-poema-inedito-salto-de-tanussi-cardoso-e-suas-dicas-da-semana/


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