Ali
ali
só
ali
se
se alice
ali se visse
quanto alice viu
e não disse
se ali
ali se dissesse
quanta palavra
veio e não desce
ali
bem ali
dentro da alice
só alice
com alice
ali se parece
Paulo Leminski
AGORA NÃO SE FALA MAIS
Agora não se fala mais
toda palavra guarda uma cilada
e qualquer gesto é o fim
do seu início:
Agora não se fala nada
e tudo é transparente em cada forma
qualquer palavra é um gesto
e em sua orla
os pássaros de sempre cantam
nos hospícios.
Você não tem que me dizer
o número de mundo deste mundo
não tem que me mostrar
a outra face
face ao fim de tudo:
só tem que me dizer
o nome da república do fundo
o sim do fim
do fim de tudo
e o tem do tempo vindo:
não tem que me mostrar
a outra mesma face ao outro mundo
(não se fala. não é permitido:
mudar de idéia. é proibido.
não se permite nunca mais olhares
tensões de cismas crises e outros tempos.
está vetado qualquer movimento
Torquato Neto
Ronaldo Werneck
𝐀𝐟𝐟𝐨𝐧𝐬𝐨 𝐑𝐨𝐦𝐚𝐧𝐨 𝐝𝐞 𝐒𝐚𝐧𝐭𝐀𝐧𝐧𝐚:
𝐞𝐬𝐬𝐞 𝐦𝐮𝐧𝐝𝐨 é 𝐦𝐚𝐜𝐢𝐨 𝐞 𝐩𝐞𝐫𝐢𝐠𝐨𝐬𝐨
O cineasta “gaúcho-carioca” Murillo Azevedo, está iniciando as
filmagens de um documentário sobre minha trajetória de 80 anos de vida e mais
de 60 de literatura. Velho amigo de meus tempos de Rio de Janeiro, Murillo
esteve comigo aqui em Cataguases no último fim de semana. Pesquisador
cuidadoso, ele acaba de encontrar uma “preciosidade” que eu desconhecia: um
artigo de Affonso Romano de SantAnna sobre meu primeiro livro, “Selva
Selvaggia”, lançado no Rio em maio de 1976. Lá se vão 48 anos. Na época, “Selva
Selvaggia” foi muito bem recebido pela critica e mereceu resenhas em vários
veículos: Folha de S.Paulo, Globo, Jornal do Brasil, Revista Colóquio Letras
(Lisboa), Pasquim & etc. Mas só agora, graças ao Murillo, leio pela
primeira vez o texto de meu amigo Affonso, publicado pela Veja. Leiam em meu
blog, link a seguir.
OLHAR YANOMÂMI
o yanomâmi traz consigo
em seu olhar de ser digno
o mistério da verde relva
no vento um vivo da selva
um yanomâmi tem o foco
fixo não perdido, é luz
transvestida de fluxo e paz
te olha rindo: sabe o que faz
o yanomâmi um ser divino
humano em desenhos gráficos
de corpo alma rios matas
andarilhos de pés descalços
o que ofende no yanomâmi
é seu olhar doce de frieza
nada a dar e tudo imaginar
nem tão feliz nem vã tristeza
faróis de uma floresta densa
brilham olhos luminares
yanomâmis não são lendas
são irmãos...familiares
há algo de muito espúrio
na invasão garimpeira
contaminação de mercúrio
contrabando de madeira
como é possível um povo
tão integrado à selva e belo
viver no desassossego de
mortes fomes flagelos
defendo-os com minha flecha
força do punho em negra tinta
nos acordes do meu instrumento
canto o grito: yanomâmi é vida
Luis Turiba
Rio de Janeiro-RJ
Sentença
faz muito tempo que eu venho
nos currais deste comício,
dando mingau de farinha
pra mesma dor que me alinha
ao lamaçal do hospício.
e quem me cansa as canelas
é quem me rouba a cadeira,
eu sou quem surfa no trilho
e ainda paga passagem,
eu sou um número ímpar
só pra sobrar na contagem.
por outro lado em meu corpo,
há uma parte que insiste,
feito um caju que apodrece
mas a castanha resiste,
eu tenho os olhos na espreita
e os bolsos cheios de pedras,
eu sou quem não se conforma
com a sentença ou desfeita,
eu sou quem bagunça a norma,
eu sou quem morre e não deita.
Salgado Maranhão
Do Livro A Cor da Palavra
Prêmio da Academia Brasileira de Letras - 2011
não possa tanta distância
deixar entre nós
este sol
que se põe
entre uma onda
e outra onda
no oceano dos lençóis
Paulo
Leminski
leia mais n o blog
https://fulinaimacarnavalhagumes.blogspot.com/
um
quarteto de passos
( pós - Torquato )
primeiro passo
desocupar rápido
esse espaço.
não há como
se virar.
encaixotados
germinam
tumores.
segundo passo
invadir vasto
teu corpo -
ócio
vazio ósseo.
não há poesia
se faltar.
a feliCidade é
uma fábrica
de horrores.
terceiro passo
sentir tátil
a físsil
forma fóssil
do salto.
não há como
se calar.
escorrem
gritos
das gretas.
quarto passo
coma meus
olhos
esqueça.
garbo gomes
Intertexto:
Poemas
Torquato Neto
Arte :
Jean Michel
Basquiat
Stardust
( 1983 )
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